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Este é o primeiro artigo que vamos lançar no blog da Eludivila, mas gostaríamos que cada um de vocês que nos leem percebesse nossos artigos como uma longa conversa sobre a clínica médica pediátrica. Assim, fiquem à vontade para comentá-los, dar suas contribuições e compartilhar com colegas da prática, combinado?
Então, vamos lá!
Neste artigo, nós vamos introduzir alguns dos muitos desafios que encontramos logo no início das nossas carreiras médicas e que, inclusive, nos orientaram na busca por conhecimentos fora da academia. São desafios pouco comentados, mas que persistem no dia a dia de um recém-formado ou residente que inaugura sua clínica médica pediátrica.
Afinal, vamos convir: o médico é um cientista em sua formação, mas, na clínica, ele é convocado por pais e crianças a extrapolarem suas técnicas para uma conexão menos técnica e mais humana. Os desafios que elencamos aqui não são universais, mas é possível que você se identifique com um (ou vários) deles. Confira!
1- Ir da formação técnico-científico para uma formação humanizada
O saber especializado é necessário e indiscutível. Mas é inegável o quanto a nossa formação médica pouco nos prepara para uma relação afetiva e efetiva com o paciente.
Exatamente por isso, nós - especializados nesse saber científico da medicina - sabemos medir a temperatura da criança que chega ao consultório, identificar um quadro clínico ou receitar medicamentos para os pais seguirem meticulosamente no tratamento da doença da criança. Mas pouco somos preparados para entender as peculiaridades do universo infantil ou sequer as pressões psicológicas que uma mãe ou pai de primeira viagem vivenciam.
Percebemos, no entanto, que muitos pais (ou outros responsáveis) chegam ao consultório pediátrico em busca de um acolhimento para a própria inexperiência. Eles querem ter a certeza que não estão errando na saúde e, principalmente, no desenvolvimento da sua criança.
Por isso, são comuns dúvidas sobre o sono, sobre a alimentação e até mesmo sobre a famosa “birra” infantil. Para lidar com essas situações, é necessário que o pediatra tenha bastante trato e se aprofunde no universo infantil para garantir a tranquilidade da mãe, do pai, padrinhos, avós etc.
2- Criar vínculo entre profissional e família
O desafio anterior está diretamente ligado a este, pois, o momento de criação de um novo indivíduo na família exige a formação de “aldeia”.
Isso não está inscrito na formação do profissional, mas é demandado cotidianamente na clínica médica pediátrica. A família não deseja um médico, ela deseja alguém que a escute ativamente e, porventura, a certifique sobre a saúde da criança e adolescente.
Pode parecer exaustivo - e o é, mas o pediatra é um personagem que tende a permanecer no seio da família por muitos anos, pois é o responsável pelo acompanhamento do crescimento do novo indivíduo.
Logo, nada mais oportuno que um vínculo de confiança seja instaurado. Além disso, o vínculo facilita que o pediatra entenda especificidades daquela família que influenciam diretamente no desenvolvimento da criança
3- Criar vínculo entre profissional e criança em um modelo tradicional tanto de espaço físico quanto de tempo
Por incrível que pareça, o espaço físico do consultório médico é sim um desafio para a clínica médica pediátrica. É preciso ter atenção na formatação dele, pois, crianças têm necessidades diferentes de um indivíduo adulto. E, em função disso, o investimento para a estrutura pode ser mais onerosa do que a de um consultório médico convencional.
Outro aspecto da clínica médica pediátrica que foge do tradicional é o tempo de duração da consulta. Vamos lembrar que, em nossa clínica, nós conjugamos as necessidades de responsáveis e as necessidades de crianças. Essas, por vezes, não sabem definir o que sentem ou qual problema possuem. Logo, é desafio para o pediatra lidar com tempos curtos ou padrões de consulta.
4- A linguagem da própria criança que, por vezes, também não entende ou não sabe falar muito bem sobre o que está sentindo
A linguagem possui função intermediadora, mas ela pode ser desafiadora caso o pediatra não saiba reconhecer as formas como a criança se expressa e se comunica em diferentes fases do seu desenvolvimento. Isso pode levar o profissional a uma saída bastante perigosa: a de “consultar o responsável” que tem seu respectivo sofrimento, esquecendo-se que a criança é sujeito dono do seu próprio sintoma.
Por isso, o profissional precisa buscar e estudar ferramentas que o auxiliem na comunicação com a criança, durante a triagem e o diagnóstico adequado de doenças comuns, assim como na identificação de desvios no desenvolvimento normal.
5- Ansiedade e demanda de comunicação síncrona (disponibilidade do pediatra por WhatsApp, e-mail, all time)
A ansiedade por respostas rápidas e prontas dos médicos é característica de pais de primeira viagem, mas não se restringe a eles. Em geral, os pais têm seus próprios ideais de desenvolvimento que pode fugir do que a criança “oferece”. Isso os coloca em alerta o tempo todo, pressupondo constantemente alguma anormalidade, e levando-os a recorrer a quem eles acreditam ser o dono da resposta: o médico, cuja disponibilidade precisa ser 24/7.
Desde dúvidas sobre o que fazer diante de uma queda da criança do sofá ao retorno das aulas durante a pandemia, é para o pediatra que o pai irá recorrer via e-mail, SMS, WhatsApp, Skype, direct de rede social e por telefonemas.
6- Trabalho solitário no consultório
Já deu para perceber até aqui que todos os desafios da clínica médica pediátrica estão interligados de alguma forma?
Este desafio reverbera em vários outros e a sua posição nesta humilde lista não significa que ele seja menos importante. Pelo contrário: para o residente, recém-formado e até para quem é experiente na pediatria, o trabalho do consultório é solitário. Pois, ele não conta com outros profissionais especializados trabalhando em conjunto em prol da criança, a não ser que o seu trabalho seja alocado em uma clínica multidisciplinar ou em um hospital.
7- Pais munidos de todo tipo de informação
Quantas vezes você já atendeu uma criança cujos pais tinham um pré-diagnóstico em mãos e até sugestão de tratamento? “Sempre”, você pode responder. Afinal, sempre houve um vizinho ou um tio que desse palpite sobre o cuidado de uma criança.
Mas a verdade é que o volume de informação na internet traz para a nossa clínica médica pediátrica mais do que palpites. Os responsáveis pelas crianças leem livros, assistem vídeos no YouTube, salvam publicações no Instagram, compartilham em grupos no Facebook e leem teses no Scielo.
Em parte, esse movimento é essencial na parceria família-médico, pois, nós médicos não somos os únicos responsáveis pela saúde da criança. Mas, sem o devido amparo, pode resultar em pais excessivos em seus cuidados e, ainda, voltados apenas para doenças. Além disso, o baixo critério sobre as informações adquiridas pode torná-los reféns de orientações perigosas para o bem-estar da criança.
8- Novos arranjos familiares
As novas configurações familiares - pais separados, mães solos, vós paternando, padrinhos deixando de ser agregados etc - têm revelado novas funções no cuidado da criança que, antes, era destinado a um núcleo bastante tradicional - pai e mãe, com presença maior da mãe.
Sabendo que a família é central no desenvolvimento do sujeito, é desafio para o pediatra entender quais implicações (disputas, ausências, vulnerabilidades, negligências etc) esses novos arranjos trazem consigo e como desenvolver um trabalho junto à criança independente de quem seja a família, sem também exercer função materna e paterna.
Curtiu o nosso artigo? Queremos agora te convidar a entender como superar os desafios que trouxemos aqui. Leia este artigo. E aproveite para se inscrever em nossa newsletter para receber artigos como este em seu e-mail. Até mais! :)

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